Não é fácil livrar-nos dos estereótipos, dos rótulos, das estampas, dos clichês. Ora são eles que nos perseguem, numa espécie de julgamento injusto e precipitado comumente vindo dos invejosos. Ora somos nós que os procuramos errantes e inseguros, numa necessidade ansiosa de auto-aprovação, tendo por critério último a opinião do grupo. Feito homens tribais, sentimos a tranqüilidade de caminharmos em conjunto, ainda que isto custe desistir um pouco daquilo que somos. É mais fácil moldar-se desde fora, que empreender o difícil desafio de conhecer-se desde dentro. Há um custo caro que nem sempre estamos dispostos a pagar: o de complicarmos bastante as nossas escolhas de vida. Tantas vezes preferimos receber uma tarefa pronta, a termos, nós mesmos, que inventar um modo novo de fazê-la. É bastante custoso ter alguma autonomia, mais fácil é andar a favor de uma coletividade. Ao que parece, existe sempre o velho cacoete de tentar obter o domínio sobre tudo, afinal de contas, nada apavora mais o homem que o desconhecido. Com facilidade abraçamos ilusões, apenas para termos a tranqüilidade e o sossego da sensação de controle. Por isso, gostamos tanto de julgar os outros e a nós mesmos, encaixando personalidades tão complexas em caixotes fáceis de carregar. O mesmo fazemos com o mundo a nossa volta, quando o trocamos por idéias, preferindo a escassez de nossas concepções e conceitos à infinita riqueza da realidade, sem nem nos darmos conta da perda irreparável. No entanto, é forçoso reconhecer que toda ilusão já nasce fadada ao fracasso. Um pequeno ser humano não demora muito a perceber a insuficiência destes subterfúgios. Obrigado a enfrentar o mundo como ele é e a mergulhar em si mesmo, um homem poderá engendrar dois caminhos distintos: ou, finalmente, aceitará a única realidade, por mais distante de suas expectativas e planos e se conformará a ela, ou inventará novas ilusões, numa fuga interminável e neurótica que durará toda a sua parca existência. É evidente que, na vida prática, existe uma grande névoa entre estes dois caminhos e não é difícil encontrarmo-nos com os pés parcialmente calcados em ambos. Assim, se quisermos, teremos que adotar uma postura firme e resoluta que nos impulsione tendencialmente ao único capaz de nos libertar de nós mesmos e de nosso orgulho. Uma direção que não deve nos levar, simplesmente, ao conformismo e a inação, o que seria igualmente um desvio de rota, mas que nos faça retornar ao centro de nossa existência, para que a partir dele possamos construir e agir, na verdadeira ação que só é possível quando há liberdade. Ensina-nos o evangelho: a verdade vos libertará, mas não nos garante que ela será agradável ou fácil de ser compreendida, muito menos que virá magicamente. Há um processo, cujo tempo é exigência e condição para que, pouco a pouco, avancemos sem sucumbir, reconhecendo que, no estado em que nos encontramos, sem alguma dose de ilusão não suportaríamos viver. Por isso, o desafio é permanente, exige coragem, mas vale a pena ser enfrentado, ainda que a custo de algum sofrimento, pois é ele que tecerá, entre quedas e recomeços, a única batalha que nos dá o sentido maior de nossa vida.
Como criamos ilusões... A vida inteira... Talvez também seja importante viver um pouco e não ficar só esperando "o quando"... Mas é possível viver e, simultaneamente, ter ilusões... Ter ilusões não é sinônimo de ser um iludido... O homem que não sonha também não vive, aquele que acha que tudo está bom como está, que não deseja evoluir, ir adiante, progredir é um acomodado, um verdadeiro morto que esqueceram de enterrar... Antes ter fé em Deus, a verdade que não traz ilusão. Ainda que existam crenças que tragam ilusão, a verdadeira fé no verdadeiro Deus nos liberta, e é capaz de trazer a felicidade, a verdadeira vida que vale a pena ser vivida. Mas realmente é um processo, quantos tropeços, quantos caminhos errados, quantas lágrimas e decepções. No entanto, quantas vitórias, conquistas, empreendimentos, alegrias. No fim, espero que o resultado final seja uma vida de uma pessoa que não se escondeu da vida, que a enfrentou com todas as forças que era capaz.
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