domingo, 29 de novembro de 2009

Convite a um dilema

Tudo o que estou fazendo na minha vida foi concebido em vista de responder o seguinte problema: Supondo-se que eu quisesse adquirir um conhecimento da história, da cultura, da filosofia, da religião, que respondesse aquela famosa exigência do Leopold von Ranke, “eu quero conhecer as coisas como efetivamente se passaram”, pouco importando se eu vou poder usar isso numa profissão acadêmica ou, se ao contrário, isso só vai me transformar num sujeito esquisito que ninguém compreende. Se você tem a coragem para isso, você pode chegar ao conhecimento da realidade, ao conhecimento objetivo, porém, note bem, quanto mais coisas você conhece, isso significa que você conhece coisas que os outros não conhecem. Saber mais é saber o que os outros não sabem. Então, quanto mais você sabe, menos você será compreendido por aqueles que não sabem. Se você quer pagar este preço, se você acha que o conhecimento vale isso... Eu acho que vale, dediquei a minha vida a isso e não estou nem um pouco arrependido. Mas eu tive que aprender ao longo do tempo a não esperar ser compreendido pelos ignorantes. Se você quer isto para você ser efetivamente um estudioso sério e não necessariamente para ser tido como tal pelos ignorantes que posam de estudiosos, então você vai ter que seguir uma série de práticas e de protocolos de aprendizagem que te permitirão chegar onde você quer. Foi isso que eu fiz a minha vida inteira e que eu gostaria de ensinar os outros a fazer. Então, quando eu coloco um problema na cabeça eu quero a resposta efetiva, eu acredito que a inteligência humana seja capaz de fazer isso. Porém, as coisas como efetivamente se passaram não são necessariamente as coisas como as pessoas gostam de imaginar como elas se passaram. E quando você descobre coisas do passado, você modifica a visão que você tem dos personagens do presente, você os olha de uma outra perspectiva. Quer dizer, a sua escala de comparação cresce formidavelmente, porque aquilo que para os outros pode ser uma novidade, você já tem elementos de comparação anterior, já não é tão novidade assim. Muitas coisas nas quais a maior parte das pessoas depositam grandes esperanças, você já vai saber de antemão que não vão dar certo, porque você já tem a experiência histórica acumulada. E também pode acontecer, o pior de tudo, que quando você tiver compreendido uma série de processos, tiver adquirido uma cultura filosófica e histórica monumental, as pessoas não queiram saber qual é a sua opinião, elas preferirão se ater aos seus preconceitos, as suas ideiazinhas, isso de fato acontece. Aí você vai ficar numa situação um pouco esquisita. Eu me lembro uma vez eu vi uma senhora caída no chão se debatendo, ela estava tendo uma crise histérica, eu achei que era uma crise epilética e fui lá ajudá-la a se levantar, e ela começou a me esmurrar gritando: “Eu odeio homem! Eu odeio homem”. “Ora, então que é que eu posso fazer minha senhora? Quer saber? A senhora não quer que eu a ajude, eu não ajudo mais”. Muitas vezes, perante, vamos dizer, os políticos, os homens públicos, os formadores de opinião, líderes empresariais, militares, você vai ficar nesta situação: Eu sei a solução para o seu problema, mas se você não quer, o problema é seu, eu só quis ajudar, entendeu? Então, você vai ficar na posição do consultor indesejado. Isto também pode acontecer... Mas ainda assim eu acho que a busca do conhecimento é a melhor finalidade da vida, não tem coisa melhor. É melhor você estar entendendo, porque você não sofrerá como um bichinho, mas sofrerá com a dignidade de um ser humano, sabendo o que está acontecendo”.
(Olavo de Carvalho, transcrição de trechos da "Introdução ao Curso de Filosofia", publicado em www.seminariodefilosofia.org/avisos)

sábado, 28 de novembro de 2009

Napoleão Mendes de Almeida

"Há os que apodam-no de "radical", "reacionário", "de direita" e demais epítetos que fazem pregão da parvoíce de quem fala, mas vejo aí senão bom senso chão, escudado por anos de estudos velhos e observação. Não obstante a famigerada caturrice de Napoleão Mendes de Almeida, suas gramáticas vendem-se em muitos tomos e edições - prova de que a popularidade pode ser antípoda à ignorância". (Luiz de Carvalho).

VEJA - Fala-se hoje um bom português no Brasil?
ALMEIDA - O país fala um português muito ruim. Chegamos a ter vergonha de construções corretas, ter receio de regências, de concordâncias.

VEJA - Onde se ouve ou lê o pior português?
ALMEIDA - A televisão é o maior veículo de erros e enganos de português que existe. Ela tem um efeito nocivo muito grande sobre o português que o povo fala. É mais difícil falar bem do que escrever - nesse caso a pessoa tem mais tempo para pensar. Só as pessoas acostumadas a falar bem deveriam lançar mão desse meio de divulgação tremendo que é a TV.

VEJA - Em que programas de TV estão os erros mais lapidares?
ALMEIDA - Até nos títulos dos programas se cometem invencionices. Há um humorístico chamado Os Trapalhões. Essa palavra não existe em português. O verbo é atrapalhar. Quem atrapalha, portanto, é atrapalhão. Por que tirar o a da palavra? Também se cometem equívocos nos noticiários, principalmente, e nas novelas. Há certos erros que me obrigam a mudar de canal. Repugna-me, por exemplo, ver um locutor de TV dizendo que se bateu um 'récorde', colocando a sílaba tônica no primeiro e. Esse locutor não é amigo do povo. Nunca tivemos essa palavra em português. É uma tontice. O certo é se pronunciar 'recórde'.

VEJA - Em que outros veículos o português é sacrificado?
ALMEIDA - Chegamos a uma situação em que nem os jornalistas sabem conjugar verbos. Tenho no meu arquivo um conjunto de erros graves de português que saíram nos jornais nos últimos tempos. Veja esta manchete do noticiário internacional, publicada em novembro de 1990: "Iraque deixará parentes visitarem reféns". Que português é esse? O certo é "visitar". Para o jornalista que intitulou a notícia, o padre Manuel Bernardes não sabe português porque traduziu o texto latino do Pai-Nosso por "Não nos deixeis cair em tentação", assim como está errada a passagem do Evangelho de São Marcos que diz "Deixai vir a mim os pequeninos".

VEJA - Na literatura brasileira de hoje a situação é melhor?
ALMEIDA - Bem, eu atualmente não sou de muita leitura. Leio revistas inglesas e francesas - sei que nelas vou encontrar os respectivos idiomas escritos de maneira perfeita. É uma prova de civismo estudar a própria língua.

VEJA - Como se reconhece o escritor que trata bem o idioma?
ALMEIDA - Autores como Alexandre Herculano e Eça de Queiroz, além de possuir uma prosa atraente, obrigam o leitor a ir ao dicionário pelo menos duas vezes por página. Isso é um ótimo sinal. No outro extremo está o escritor que se lê por 100 ou 200 páginas sem deparar com uma palavra que não se conheça, e que escreve com períodos de gago, aquele que tem dois pontos finais em cada linha. Períodos curtos não têm graça. Neles não há concatenação, não há subordinação das orações. Escritores desse tipo não conhecem as conjunções ou têm medo de usá-las porque não sabem usar o verbo de acordo com elas.

VEJA - Como falam os políticos brasileiros?
ALMEIDA - Os que falam bem são exceções, e há muito poucas. Dizia-se que Collor falava bem, mas ele escorregava, não sei se nesse meio tempo resolveu estudar gramática. Já o Lula usou uma frase muito interessante quando era candidato à Presidência. Ele dizia "Vote ni mim".

VEJA - Lula deveria estudar gramática?
ALMEIDA - Ele tentou. Lula chegou a se matricular no meu curso, mas não chegou a responder à primeira lição escrita nem pagou a segunda mensalidade. Simplesmente desapareceu. Depois de um certo tempo acabamos rasgando a ficha dele, na limpeza do arquivo. Rasguei com prazer, depois de uma greve dos metalúrgicos que deu o maior prejuízo ao país.

VEJA - O senhor também rejeita o português falado pelos sertanejos, carregado de regionalismos?
ALMEIDA - Eu respeito. Não vou interromper uma conversa para dizer ao interlocutor que o certo é dizer 'nós vamos' e não 'nós vai'. A verdade é que em termos de vocabulário há regionalismos muito interessantes. Um dia eu estava em Belém e pedi uma informação na rua, sobre onde ficava tal escola. O sujeito me disse que era fácil, que era só tomar uma sopa, aquela sopa que estava logo ali junto ao muro. Eu me espantei. Não sabia, mas está lá no dicionário - sopa é a jardineira, o ônibus local.

VEJA - O que o senhor acha das reformas ortográficas feitas periodicamente no português?
ALMEIDA - Vejo como uma forma de comércio. O interesse das reformas ortográficas é financeiro, não intelectual ou prático. Tem por fim o lucro, seja da Academia Brasileira de Letras, seja de alguma editora, seja de algum rato de ministério, como é o caso atualmente no Planalto. Certa vez o Cláudio de Souza, então presidente da ABL, esteve no meu escritório, antes da reforma de 1943, e me perguntou por que eu era contra a reforma ortográfica. Ele me explicou que a Academia tinha despesas com a impressão do vocabulário. Eu disse: meu caro, não acha que a sua resposta deve ser substituída pela reflexão de que o interesse da reforma ortográfica é de caixa, e não de ensino? O escritor interessado quer modificar a ortografia, mas o livro dele, sua gramática, com a nova ortografia, já está pronto. Em 1949, quando saiu um decretinho no Diário Oficial introduzindo a nomenclatura gramatical brasileira, um dos tratantes da comissão já estava com o livro dele, incluindo as modificações, na terceira edição.

VEJA - O acordo de unificação ortográfica entre o português do Brasil e o de Portugal, negociado atualmente pelo ministro da Cultura, Antônio Houaiss, encaixa-se nesse caso?
ALMEIDA - Faço minhas as palavras do jornalista Paulo Francis, num artigo recente. O bom dessa rusga diplomática que está ocorrendo entre Brasil e Portugal é que ela matou o acordo ortográfico do Antônio Houaiss. O Houaiss não é bobo, já admitiu que o acordo foi arquivado por tempo indeterminado. Isso porque ele é editor, paga imposto de renda pelo que edita. Qual seria o seu interesse na reforma senão ser o primeiro a dizer: "O que foi decretado ontem já está em forma de livro?" Vernáculo não é política para viver de alternativas, para alimentar-se de amizades e confrarias. O vernáculo vive de escritores, e estes não se impõem pela quantidade, senão pela qualidade de obras que expressem o belo sem protuberâncias vocabulares nem manifestação de desnutrição, de doenças gramaticais.

VEJA - A unificação da ortografia usada no Brasil e em Portugal, prevista pela reforma, não seria desejável?
ALMEIDA - Que unificação? Não existem duas línguas, apenas uma.

VEJA - Mas muitas palavras são usadas ou grafadas de forma diferente nos dois países.
ALMEIDA - E no Brasil não acontece o mesmo, de região para região? Não há diferenças prosódicas e de significação? Isso não prejudica o idioma de forma alguma. Tome-se, para efeito de comparação, o dicionário Webster da língua inglesa. Para certas palavras ele dá quatro pronúncias diferentes. Outras são mostradas com três grafias diversas. Isso é motivo para um espertalhão querer introduzir uma lei que determine uma só forma ortográfica, uma só pronúncia da palavra?

VEJA - O acordo ortográfico prevê a eliminação de vários acentos nas palavras. Isso não tornaria mais fácil a tarefa de quem escreve, lê ou estuda o português?
ALMEIDA - A acentuação no português é um horror. A ortografia de 1943 está errada, mas se forem mexer vai piorar ainda mais.

VEJA - O que há de mais aberrante na acentuação do português?
ALMEIDA - Tome-se, por exemplo, a palavra auxílio. No idioma espanhol existe essa mesma palavra, com o mesmo significado, mas ao contrário do que ocorre no português ela leva acento na forma verbal, auxilío. O motivo é simples: de cada dez vezes que essa palavra aparece corriqueiramente, talvez apenas uma seja na forma de verbo, nas demais ela aparece como substantivo. Então, nada mais lógico que se deixe o acento para diferenciar o verbo. Há mais bom senso na ortografia espanhola nesse aspecto.

VEJA - O acordo prevê também a volta das letras k, w e y ao alfabeto, assim como a eliminação do trema no u. O que acha dessas propostas?
ALMEIDA - As três letras em questão nunca deveriam ter saído do alfabeto. Precisamos delas no dia-a-dia, na matemática, por exemplo, e também na escrita comum. Quanto ao trema, é inútil, ninguém precisa dele. Na verdade, quem deve ensinar a pronúncia certa é a escola. Eu mesmo não uso acentos quando escrevo meus rascunhos. Para quê? Eu sei ler. Mas para acrescentar o k, o w e o y ao alfabeto, assim como para eliminar o trema, não é preciso fazer uma grande reforma ortográfica. Basta um decretozinho, uma lei que regule o assunto.

VEJA - As gírias atentam contra o bom português?
ALMEIDA - Não sou contra as gírias. Elas são um fenômeno normal, que revela a saúde do idioma. Elas em geral duram seis meses ou um ano. Conforme sua natureza, a gíria entra para o dicionário ou para a gramática. Por que eu investiria contra a expressão 'é sopa' quando ela surgiu? Há quanto tempo não se ouve essa expressão?

VEJA - O senhor é contra os neologismos?
ALMEIDA - O neologismo é uma necessidade. Se há invenções, precisamos dar nomes a elas. Vamos buscar esse nome com radicais e sufixos nossos, ou com radicais gregos, latinos, ou vamos adaptar a forma inglesa, francesa ou alemã à nossa forma. O estudo da etimologia é maravilhoso, embora não tenha utilidade. Mas é curioso. Por exemplo: poucos sabem que a palavra joelho - ou geolho, como se dizia antigamente -, em português, é a mesma palavra knee, em inglês. A origem de ambas é genunculum, em latim. A sílaba inicial ge é gutural forte, corresponde, na pronúncia latina, ao som de k em inglês. O n já está na palavra e a terminação unculum corresponde à nossa terminação lho ou aos dois e do inglês. O estudo do latim é necessário. Foi uma infelicidade jogá-lo fora do currículo escolar no Brasil, mormente para quem vai praticar leis, estudar Direito.

VEJA - A língua portuguesa tem bons dicionários? Quais?
ALMEIDA - Prefiro não propagandear os dicionários que temos. Mas posso elogiar o de Alberto Carlos Silva, um autor de Campinas que morreu mocíssimo.

VEJA - Como o senhor vê as atividades da Academia Brasileira de Letras?
ALMEIDA - Sabe quantas vezes Rui Barbosa esteve na Academia? Uma única. Euclides da Cunha nunca precisou dela. Monteiro Lobato idem. Mas há escritores que são fregueses das academias de letras que se espalham pelo país. A Academia não contribui em nada para a melhora do idioma.

VEJA - Desde quando o brasileiro fala e escreve mal?
ALMEIDA - Pode-se dizer que o início da derrocada da nossa língua data de 1931. Com a Revolução de 30, introduziram-se as férias escolares de julho. Aí ela começou a degringolar. Talvez os próprios pais tenham provocado essa mudança, por querer descansar, mas esse descanso começou a prejudicar o ensino dos filhos.

VEJA - Essa explicação não é demasiado simples?
ALMEIDA - Essa é uma imagem histórica que uso para ilustrar um fenômeno que é bem mais complexo. O erro principal vai mais longe - na pobreza de horas diárias de aula no curso primário, por exemplo. Verifique-se se em algum país dito civilizado existem menos de oito horas de aula por dia no curso primário. Em todo os países o aluno fica na escola oito horas. Mas no Brasil o aluno vai à escola para comer Há também a questão da remuneração dos professores: os que ensinam português não podem ter o mesmo salário dos que ensinam desenho, por exemplo. Que trabalho tem um professor de desenho? Num relance ele dá a nota para o aluno. O professor de português tem que ler palavra por palavra, para ver se o aluno não trocou um c por dois s, um g por j. E ao voltar à sala de aula ele tem que chamar os alunos um por um para explicar os erros. O de Antonio vai servir de esclarecimento para Benedito, todos se aproveitam dos erros de todos, mas esse trabalho tem que ser bem remunerado.

VEJA - Que outras deficiências do ensino fazem com que o brasileiro fale mal seu idioma?
ALMEIDA - Existe hoje uma indústria do livro didático, comandada por indivíduos incapazes de montar ou explorar um colégio, um curso que seja. Esses livros didáticos não têm concorrência, contenham eles as maiores violações gramaticais e asnices ortográficas. O professor chega ao colégio e já encontra nas prateleiras os livros que deve usar. Quer dizer que ele não tem competência para escolher? E quem se julgou competente para escolher? Um interesseiro. O ensino está entregue a um outro tipo de comércio, o das apostilas. Não se dá o texto da matéria, apenas apostilas. E qual é o valor das apostilas no futuro? Nenhum. É progresso encher uma classe de apostilas, de livrinhos e livrecos sem vulto nem tomo, tão inúteis quanto desarrazoados, sem índices nem remissões? O aluno deveria comprar o livro e o professor ter em mãos um texto da matéria que leciona. Até há algum tempo, o professor era obrigado a assinar um diário de aula, relatando que matéria tinha dado naquele dia. Existe isso hoje? Não. Fala-se mau português por causa do sistema escolar.

VEJA - Em que região do Brasil se fala o melhor português?
ALMEIDA - É difícil especificar, mas no Maranhão, certa vez, conheci um professor que, embora muito modesto, divertia-se conversando em latim com a filha. Isso é significativo. Oxalá um dia possamos dizer que o Brasil todo fala uma língua disciplinada, que revele educação, instrução, que revele um país de pessoas formadas para a sociedade.

VEJA - Estamos muito longe disso?
ALMEIDA - A distância é de pelo menos três gerações.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Teddy

Um gênero muito interessante, que mescla as aventuras, as cores, os signos e a multiplicidade de personagens e possibilidades do romance com a realidade, com aquilo que há de mais concreto e verdadeiro, como a história, é aquele da biografia. Sempre achei surpreendente conhecer a vida de pessoas, que por vezes é tão fantástica que beira o inverossímil.
Estou lendo Lion in the White House – A life of Theodore Roosevelt, de Aida D. Donald. A cada página virada minha admiração pelo espírito americano aumenta e minha vergonha pela política nacional se supera.
Teddy – como é carinhosamente chamado pelos compatriotas esse presidente americano – foi um exemplo de nobreza, coragem, caráter, virtuosidade, força e incontáveis outros adjetivos. Acho bom perceber como seres humanos concretos, em sua singularidade, levaram a história para este ou aquele caminho, o que me vacina contra a tendência racionalista de olhar o passado que reina hoje em dia.
Eu não sabia disso e penso que muitos também não sabem. Teddy ganhou a medalha de honra por liderar um dos regimentos que libertou Cuba dos espanhóis, antes de se tornar presidente ou mesmo de ser governador de Nova York, como sucedeu posteriormente. Curioso, não é? Não somente foram os americanos que livraram a ilha caribenha dos colonizadores, mas também foi um dos membros da elite branca de olhos azuis quem colocou o peito à mostra para o perigo das balas. Naquele tempo, em 1898, a guerra era muito diferente. Foram todos ou a pé ou a cavalo, com pistolas e rifles, alguns poucos canhões. E mais, o comandante não ficava apenas sentadinho atrás da tropa, dando ordens em local seguro. Pelo contrário, Teddy era o primeiro da fila, encorajando todos os soldados.
Quanta coisa podemos esquecer e quanto deixamos de compreender, quando ignoramos nosso passado. Em tempos de nunca antes na história desse país, o esquecimento é coroado. Os mocinhos com a vermelhinha camiseta guevarista acreditam que Cuba libre não passa de um drink da balada, ou de um grito comunista contra o Tio Sam. Barbaridade! – diria meu avô.
Que tal uma espiadinha no que ocorreu naquela guerra?
“Under their aggressive colonel the Rough Riders were the first cavalry forces ashore. The nearsighted Roosevelt, who had twelve pair of eyeglasses sewed into his hat and other places, was on Cuban soil, spoiling for a fight. Neither he nor anyone else saw any Spaniards, and not a shot was fired to impede the landing. The American troops yelled, “Viva Cuba libre”. Their Cuban rebel allies replied, “Viva los Americanos”. The Rough Riders ran up the first American flag over Cuba, and the band played “The Star-Splangled Banner”. It was a picture-perfect beginning to what would become a bloody battle for Cuban freedom and, in Roosevelt’s view, American manhood. For the Spanish, it was the beginning of the end of their 382-year rule over Cuba, the jewek of its western empire”.
Esse foi o começo tranqüilo da sangrenta batalha que esperava por Teddy. Sem comida, com pouca munição, e vestidos por mais de um mês com as mesmas roupas, a tropa seguiu bravamente pela libertação cubana. Quando os soldados estavam famintos, Teddy esvaziou os próprios bolsos para comprar suprimentos. Ao final, foi homenageado:
“In September, Roosevelt’s First Volunteer Cavalry presented their commander with a Frederic Remington sculpture called the Bronco Buster. He responded to the honor by saying that he was proud of his regiment because it was an American troop composed of men of all the different races who had, either by inheritance or adoption, made America their country. He closed with a tribute to the brave black soldiers who fought with the Rough Riders”.
Mas Teddy não foi somente este corajoso guerreiro. Homem de estudos e de talento, foi o criador do Canal do Panamá e pai da marinha moderna americana, escreveu livros e mais livros, com altíssima qualidade literária, como prenunciavam seus escritos na juventude e seu desempenho invejoso na Universidade de Harvard. Desenvolveu estudos sobre a natureza, lançando obras sobre o Wild West, sobre a vida que levavam os rancheiros e cowboys e mais tarde viria a criar os parques nacionais dos EUA. Conta-se que um dia, numa caçada, ele poupou um pequeno urso por piedade, fato que deu origem ao nome Teddy Bear. Não é sem razão que o Museu de História Natural de Nova York tenha dedicatórias e mais dedicatórias a ele.
As crianças de hoje talvez não compreendam como o fraco personagem do filme, interpretado por Robin Williams, foi um grande presidente. É bom lembrar, então, que a Noite no Museu é a ficção, a realidade – ah! – a realidade é muito mais interessante...

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Pequeno Desabafo

Eu sei que depois de tantos dias de silêncio a nossa caminhança mereceria algo mais caprichado. Mas permitam-me apenas este desabafo, bastante curto, a preguiça me impede de desenvolver melhor a digressão (ou talvez eu tenha sido infectado pelo ambiente que motivou esta minha vinda ao blog). O ambiente: a Casa dos Advogados, no dia de eleição da OAB (somado a alguns acontecimentos locais, que deixo de retratar). Perdoem-me se, por acaso, meu espírito foi invadido por uma excessiva sensibilidade, quase um medo, de ingenuidade pueril. Mas o asco, misturado a tristeza, é inevitável, como também foi inevitável despejá-lo aqui, para que não permaneça dentro de mim pelo resto do dia. Não por acaso a tal visita fez-me lembrar, contra a minha vontade, dos tempos em que eu frequentava a alta advocacia paulistana. Agora a situação é esta: Tenho diante de mim este mal estar indesejável, o presente amargo despejado sem licença no meu quintal, enquanto as víboras se deliciam da carniça. Por qualquer razão, algo sopra em meus ouvidos: "Eis que vos envio como ovelhas no meio de lobos".