“Os céus e a terra tomo hoje por testemunhas contra vós, de que te tenho proposto a vida e a morte, a bênção e a maldição. Escolhe, pois, a vida, para que vivas tu e a tua descendência, Amando ao Senhor teu Deus, dando ouvidos à sua voz, e achegando-te a ele; pois ele é a tua vida, e o prolongamento dos teus dias; para que fiques na terra que o Senhor jurou a teus pais, a Abraão, a Isaque, e a Jacó, que lhes havia de dar”.(Deuteronômio, 30: 20,21)
O findar de um ciclo e o advento de um novo período sempre nos convida à reflexão. Muitas vezes somos tentados a fazer um balanço do que se passou e projetamos em nossas mentes aquilo que gostaríamos que acontecesse em um futuro próximo, fato que nos enche de esperança e alimenta, ao mesmo tempo, nossas angústias.
Sinceramente, confesso que estou tentado a duvidar do tão propalado “livre arbítrio”. Ao analisar nossa breve caminhança, tenho a impressão de que nosso campo de decisão é tão amplo quanto ao de um trem que necessariamente caminha sobre seu próprio trilho, ou das águas de um rio que necessariamente correm sobre seu leito.
Quantas vezes, ao analisarmos como as coisas se passaram em nossas breves vidas, não temos a nítida impressão de que fomos conduzidos ao invés de “decidirmos” o rumo a ser seguido? Quantas vezes um turbilhão de inúmeras coincidências não conspiraram para que as coisas, por menores que fossem, ocorressem da forma como ocorreram?
Claro que qualquer pessoa poderia objetar: “Mas de fato, você tem livre arbítrio. Você poderia, por exemplo, matar o seu irmão”. Mas será que esta é, realmente, uma opção? Posso escolher entre comer arroz com feijão ou pizza no dia de hoje, mas não é dessas decisões menores a que me refiro. Refiro-me àquelas que de fato poderiam ter sido tomadas, e que de forma efetiva possuíram a aptidão para alterar o curso de nossas vidas, contribuindo para que nos tornássemos aquilo que somos no dia de hoje.
Tenho certeza de que não nos unimos por acaso. Não nos tornamos amigos por acaso. E nada em nossas vidas aconteceu que não fosse por vontade de nosso Pai, criador do céu e da terra. Tal como a passagem citada acima, a única decisão que podemos de fato tomar é abraçar a fé. O caminho, creio eu, já está há muito traçado, e tenho grande certeza de que nem um fio de cabelo de nossas cabeças cairá, que não seja por vontade Dele.
O caminho que Ele escolheu para nós, obviamente, eu não sei. No dia de hoje, vivendo o momento presente, apenas agradeço a Ele todos os dias por ter irmãos como vocês, caminhantes.
Sigamos em frente pelo caminho que acreditamos ter escolhido, mas que desconfiamos ter sido traçado por alguém maior que nos rege e nos orienta, não importa o tamanho das dificuldades.
Este tema do livre-arbítrio de fato é muito espinhoso. Se ele não existisse, o mal não seria possível, o bem seria automático. Por alguma razão, que não compreendemos, Deus preferiu nos dar o livre-arbítrio a nos transformar em "robôs do bem". De algum modo, o preço do pecado valeu a pena ser pago. Deus quer que nos aproximemos dele por nossa vontade. Mas não nos deixa abandonados. Nos enche de graça, nos chama a todo instante, abre-nos o caminho. Mas exige de nós uma escolha, um passo, uma ato de nossa vontade. Apesar de tudo, de todas as graças recebidas, de todos os fatores que influenciam nossas escolhas (a família, a genética, o temperamento, a cultura), ainda existe sim um grande espaço de responsabilidade pessoal. E é neste espaço que mora o livre-arbítrio.
ResponderExcluirConcordo com você, caro amigo. Não acho que o bem-agir seja automático, ou que nosso intento não possa influir em nada... São apenas impressões que, por vezes, me levam a duvidar da dimensão deste livre arbítrio. Que ele existe, não duvido. Seria ingenuidade demais supor que todas as nossas decisões foram pré-programadas, fato que nos isentaria de qualquer responsabilidade sobre nossos atos. A crônica acima não é teológica, filosófica, ou coisa que o valha. São meras impressões, no sentido mais vulgar possível... impressões de que nos momentos mais determinantes de nossas vidas, algo nos guiou intimamente, apontando-nos o caminho a seguir...
ResponderExcluirUai, é claro que entendi o contexto da sua reflexão, Toninho. O que fiz foi só aceitar a proposta e colocar umas idéias sobre o tema... não foi nenhuma crítica ao texto... Compreendi que você fala justamente daqueles raros momentos em que temos a percepção de que algo nos guia, momentos preciosos em que sentimos a mão do Pai, como se o livre-arbítrio não existisse. Tem uma frase do Guimarães em que ele diz mais ou menos isso: Tendo Deus fica menos grave descuidar um pouco... Acho que é isso.
ResponderExcluirO enigma do livre-arbitrio, da onipotência de Nosso Senhor e da providência...
ResponderExcluirHoje em dia passo menos vezes por esses momentos, mas às vezes eles surgem. De minha parte, para não parar ali na estupefação, mudo um pouco a clave, e tento pensar mais na vocação. A relação se torna mais clara para mim: existe um chamado do alto e eu posso ouvir e atender, ouvir e não atender ou não ouvir absolutamente. Como todo chamado, este existe para algo, isto é, o chamado já traz um caminho para o qual se chama. Mas o chamado precisa ser ouvido e atendido, embora o caminho permaneça, permaneça mesmo que ignorado, permaneça vazio e apreensivo, na espera de que possa levar mais um para a casa do Pai.
Grande Miguelito (sei que me compreendeu!)... Grande Pedrão, e porque não dizer, grande João Augusto (com quem já tive a mesma conversa tempos atrás)... amigos de caminhança. É destes raros mommentos que falamos. Para nós, caminhantes, não existe escolha senão atender ao chamado que nos guia, nos orienta, e nos fortalece nas dificuldades. Porque uma convocação de fé não aceita "não" como resposta. É o caminho posto aos verdadeiros cristãos, dignos do nome, como bem salientou nosso irmão Pedrão em sua belíssima mensagem de natal.
ResponderExcluirConfesso, porém, que a fraqueza de meu caráter, e todos os vícios que me acometem tendem a me desviar da verdadeira caminhança, e da própria virtude que tantas vezes observo nos outros e percebo ausente em mim...
Já discutiram bastante, cheguei no final... O tema em questão também envolve a velha briga entre católicos e protestantes: salvação por obras, por nossos próprios atos ou pela graça, pela fé. Até hoje, há muitas discussões. E o que sei é que ambas se complementam, somos salvos por Deus, por graça do Espírito Santo, mas não deixamos de precisar atuar conforme o bem.
ResponderExcluirOlhem só o que nos diz o Papa João Paulo no final da maravilhosa Veritatis Splendor:
"119. Esta é a consoladora certeza da fé cristã, à qual se deve a sua profunda humanidade e a sua extraordinária simplicidade. Por vezes, nas discussões sobre os novos e complexos problemas morais, pode parecer que a moral cristã seja em si própria demasiado difícil, árdua para se compreender e quase impossível de praticar. Isto é falso, porque ela, em termos de simplicidade evangélica, consiste em seguir Jesus Cristo, abandonar-se a Ele, deixar-se transformar pela Sua graça e renovar pela Sua misericórdia, que nos vem da vida de comunhão da sua Igreja. «Quem quiser viver — recorda-nos S. Agostinho —, tem onde viver, tem donde viver. Aproxime-se, creia, deixe-se incorporar para ser vivificado. Não abandone a companhia dos membros». Portanto, todo o homem pode compreender, com a luz do Espírito, a essência vital da moral cristã, inclusive o menos dotado, antes e sobretudo quem sabe conservar um «coração simples» (Sal 85 86, 11). Por outro lado, esta simplicidade evangélica não dispensa de enfrentar a complexidade da situação, mas pode introduzir na sua compreensão mais verdadeira, porque o seguimento de Cristo porá progressivamente a descoberto as características da autêntica moralidade cristã e dará, ao mesmo tempo, a energia vital para a sua realização. É tarefa do Magistério da Igreja vigiar a fim de que o dinamismo do seguimento de Cristo se desenvolva orgânicamente, sem deixar que lhe sejam falseadas ou ocultadas as exigências morais com todas as suas consequências. Quem ama Cristo observa os seus mandamentos (cf. Jo 14, 15)."