sexta-feira, 3 de abril de 2009

Sim ou não!

Não queria atropelar o grito poético do querido J.A.! (que, aliás, ainda vou comentar a altura...).
Ocorre que eu já havia escrito estas idéias e quando entrei no blog para publicá-las percebi que o amigo tinha acabado de “postar” o seu texto. Como acredito que tudo nos encaminha na mesma direção e os textos são de naturezas diversas, achei que não haveria problemas. Além do mais, diante da penúria que tem passado o nosso endereço internético nos últimos dias, que esta dupla intervenção seja o sinal de um bom presságio!


Um pensamento me ocorre. Quando observamos a história, percebemos que a humanidade já atravessou momentos especialmente muito difíceis. Tempos marcados por guerras, desequilíbrio social, crise nos padrões morais... Tempos em que a cultura e o saber são relegados à segundo plano e emerge no homem a ditadura dos piores vícios. Às vezes parece mesmo que a história é cíclica e que, de tempos em tempos, algumas realidades se repetem e os mesmos desafios, com novas faces, têm de ser novamente enfrentados.
Vejam, por exemplo, esta descrição de um tempo muito distante do ano de 2009, quando o Império Romano entrava em decadência, por volta do ano 300:

“[...] A estrutura social de Roma não tinha sido realmente afetada pela doutrina cristã. A nobreza, os patrícios e os ricos continuavam sua vida de abundância e luxo, que lhes era tornada possível pelos escravos e pobres que eles exploravam e desprezavam. Até mesmo os cristãos, cujo Evangelho ensinava diferente modo de vida, não podiam escapar ao fascínio das convenções sociais. Todos em Roma, pagãos e cristãos igualmente, viviam na excitação do luxo e dos prazeres mundanos. Era a fuga de uma civilização perseguida pelo senso de sua ruína iminente. Os homens, enfatuados pelo orgulho, sempre em busca de melhores posições e de mais cargos, em nada pensavam senão em dinheiro e poder. As mulheres gastavam o tempo em rendas e folhos de camisa. Vestidas com trajes suntuosos, com cabeleiras de ouro, aquelas bonecas empoadas e pintadas eram transportadas em liteiras de marfim, de banquete em banquete, de dança a dança, até que, exaustas pelo peso de suas jóias, buscavam o apoio de seus escravos, para levarem-nas a seus leitos de ócio”. (René Fülöp-Miller, “Os Santos que abalaram o Mundo”).

Não é muito difícil imaginar que o texto, levemente adaptado, descreveria com muita propriedade o nosso tempo. Sei que não digo nenhuma novidade a vocês e que muitas vezes já pensamos nestas “coincidências” do passado, que na verdade apenas refletem sempre o mesmo desafio do homem e de sua natureza, na constante luta contra o mal. Mas apenas queria chamar atenção para que refletíssemos novamente sobre o nosso velho dilema a respeito da nossa vocação neste mundo.
Naquele momento da história, diante de tamanha crise, nasceu e cresceu cada vez mais o movimento monástico. Homens e mulheres preocupados com a situação do mundo e desejosos de afastar-se da decadência e dos males mundanos recolheram-se em muros e iniciaram uma verdadeira e lenta “revolução” cultural para a época. Foi graças aos mosteiros e conventos que a cultura ocidental foi preservada e, mais do que isso, foi fortalecida e, mais tarde, espalhada para fora dos muros. Foi deste movimento que nasceram os hospitais, os asilos, as universidades, as bibliotecas. Uma página muito bela escrita por grandes homens.
Nos outros momentos difíceis da história sempre surgiram movimentos, grupos, que inventaram formas de preservar os valores fundamentais da humanidade, a cultura, a religião, os valores morais. Que praticaram estes valores, que deram o seu exemplo, ainda que para isso sofressem perseguições e mortes. Sempre houve uma resposta à altura para preservar o Bem. Graças a Deus tudo isso sempre foi preservado de alguma forma.
Refletindo sobre estes fatos históricos, penso mais uma vez no dever que temos de seguir este chamado que sentimos e compartilhamos. Sozinhos somos fracos, pouco, muito pouco. Mas juntos ganhamos força e podemos muito. Não tenho dúvidas de que vivemos um desses momentos especialmente difíceis da humanidade. É preciso ter consciência disso. Se olhamos o passado percebemos facilmente. É difícil ter a real dimensão do que acontece no tempo presente, mas podemos ter uma boa idéia: violência, medo, perdição, decadência moral, elogio dos vícios, culto ao pecado, perda de força dos valores religiosos, apego material, oportunismo, malícia...
Muitas de nossas dúvidas, nossos sofrimentos decorrem exatamente deste nosso tempo. E precisamos saber que a vida exigirá de nós uma posição, uma decisão com relação a tudo isso e existe apenas uma escolha certa. Temos que assumir a nossa responsabilidade e agir corretamente, dando o nosso exemplo. Sinto cada vez mais que encontro em vocês pessoas muito especiais. Nosso encontro não foi casual. De algum modo algo deve nascer destas nossas conversas, destas nossas reflexões. Não estou dizendo que vamos mudar o mundo... Não se trata disso. Estou dizendo que, assim como cada homem na Terra, temos a nossa responsabilidade. E talvez tenhamos que exercê-la em conjunto. Não sabemos ainda como. Mas vamos aguardar o que a vida vai nos trazer. Não sei se decidiremos nos isolar em desertos e cavernas, como faziam os primeiros ermitões, em fuga à vida mundana demasiada perversa. Ou se vamos nos tornar beneditinos, franciscanos ou descobriremos uma nova comunidade, talvez um santo ou profeta caminhando pelas nossas ruas a quem possamos seguir. Ou se será como membros do Poder Judiciário. Mas o que não podemos esquecer jamais é que nós temos uma responsabilidade e que o chamado para assumi-la já começou há muito tempo a ser feito. Caberá a nós responder ou não a Ele. Não temos meio caminho. Ou é sim, ou é não.

Um comentário:

  1. Exatamente meu caro amigo... ou sim ou não. É impressionante como a natureza humana faz renascer os mesmos males, ainda que em épocas distintas. Não se trata de mudar o mundo, mas sim de atuar sobre o nosso meio, como pontos de resistência e de irradiação de valores que a cada dia a humanidade parece esquecer. Basta manifestarmos em nossas vidas e vivermos concretamente a vontade Dele para que a resposta a este chamado comece a se delinear. Sigamos na luta, caro amigo. Sigamos em frente.
    Abraços e saudade

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