quarta-feira, 28 de março de 2012

Queridos Amigos

É verdade que muito precisava ser dito nestes dias, em que, por alguma razão, nosso país foi tomado por acontecimentos importantes. Por isso, tantos textos de autores diversos foram postados aqui, para que também o nosso pequeno espaço pudesse participar das acaloradas discussões. No entanto, isto custou algum afastamento da nossa caminhança. As palavras alheias não possuem o mesmo calor daquelas vindas de quem amamos. E como sinto falta, meus amigos! Falta das palavras amigas! Tenho visto tantas coisas, a vida tem me revelado maravilhas e também tenho padecido muitos desafios e sofrimentos... Como queria tê-los por perto para encontrá-los em cada manhã, para iniciar o dia com mais força e alegria. Ou para abraçá-los no entardecer, quando poderia ouvi-los e desabafar as amarguras da vida após um longo dia de trabalho. Para empreender nas horas vagas aventuras diversas, visitas a lugares novos ou a pessoas necessitadas. Tenho medo de perdê-los, mas tenho ainda mais confiança de que a nossa amizade é firme o bastante para durar. Sei que precisamos cultivá-la, como uma planta no jardim. Não se pode descuidar do sol, da água e da qualidade do solo. Há ainda muitas pragas que vez ou outra a ameaçam. É preciso estar atento, vigilante. Temos nos esforçado e cumprido a tarefa, embora de forma imperfeita, como é digno de nossa humanidade.

A vida está corrida, estamos tomados de compromissos vários e de um tempo curto para realizá-los. São tantas demandas, tantas vozes, tantos convites... É difícil encontrar tempo para rezar, para estar só, para dedicar-se às coisas desinteressadas, mas muito importantes. Estive pensando que as coisas mais importantes da vida são estas que fazemos com tanto desinteresse, que as esprememos no intervalo de nossas horas ocupadas, como se a elas coubesse apenas cobrir os espaços vazios dos dias. Porque passado algum tempo, nossa memória só é capaz de lembrar justamente destes pequenos intervalos de vida. E na lembrança eles ganham um espaço tão grande que ocupam toda o nosso passado, como se mais nada houvesse além destas curtas horas. Então lembramos das leituras que fizemos antes de dormir ou logo após o almoço antes de reiniciar nossas atividades. Da visita a uma Igreja empreendida por acaso porque por ali perto passávamos entre um compromisso e outro. De uma música que tocou fora de hora no rádio do carro. Das vezes que escrevemos para o blog algum texto que não nos traria nada, além dele mesmo e da amizade. Das conversas que tivemos no supermercado onde sem querer encontramos algum conhecido. Das visitas rápidas que fizemos às pessoas queridas. Das noites de violão e vinho com os amigos. Das horas que passamos escolhendo uma nova cor para pintura da casa ou um presente de aniversário. Das vezes que subimos no alto de uma montanha e avistamos o vale ou deitamos na beira da praia apreciando o horizonte do mar.

Meus amigos! Sobreviveremos neste nosso mundo todo invertido? De que modo? Como encontraremos a contemplação tão essencial? Como quebraremos esta distância que nos separa? Como nos livraremos destas horas que nos acorrentam, destes compromissos que não são nossos? Onde exerceremos a caridade, a entrega ao próximo? Fugiremos da burocracia inútil, do desperdício dos dons que recebemos, da idolatria do prazer e da abundância? Resistiremos ao erro, à ignorância, à covardia? Seremos fortes o suficiente para cultivarmos as virtudes num ambiente tão hostil? Teremos o discernimento necessário para não nos deixar levar pelas falsas promessas, pelas ilusões, pelo marketing que nos cerca com tanta agressividade? Como venceremos todas as mentiras e o veneno que nos ameaça?

Tenho muita esperança. Não em nossas forças, mas na inspiração e na coragem que Jesus nos dedica. Creio que encontraremos sim saída para tudo e ela estará no espírito de amor e sacrifício. Peço desculpas, se mais uma vez retomo o tema religioso. Ele realmente está em tudo, é impossível evitá-lo. De tal modo tomou o sentido de minha vida que já não sou mais capaz de fazer ou dizer nada que não esteja de alguma forma relacionado a Ele. Lembro dos nossos encontros no Pátio da faculdade, naquelas tardes desinteressadas que passávamos meditando o mistério da Igreja e da religião, conhecendo os dogmas, as vidas dos santos, a Tradição. Pouco mais de cinco anos depois mal posso me lembrar daquele menino tão avesso ao catolicismo. Como foi possível tamanha mudança? Porque um amigo tão católico foi entrar em minha vida? Porque escolhi a faculdade vizinha de um mosteiro? Como fui capaz de retomar a confissão? Tudo soava tão ridículo, tão antigo, tão quadrado. Como fui capaz de me ajoelhar diante de um pedaço de pão? Hoje olho ao redor de mim e vejo que o crucifixo de casa aumentou muito de tamanho, há imagens de santos, a sagrada família, o menino Jesus, Nossa Senhora, missa aos domingos, como?

Encontrar Deus é sempre mergulhar num grande mistério. A Verdade não nos dá muitas certezas, pelo contrário. De um modo especial abre nosso coração a muitas dúvidas, mas ao mesmo tempo nos acolhe numa grande confiança. Pouco a pouco ilumina a dura realidade, mas com a mesma precisão nos inunda de Esperança. Por isso, perdemos o medo de olhar. Olhar profundamente para nós mesmos e para o mundo ao nosso redor. Perdemos o medo de chorar. Chorar com mais freqüência, para que as nossas lágrimas amoleçam o duro barro do nosso orgulho. Já não sabemos de nada, embora tudo já esteja revelado. Já não somos donos de nossos passos, embora tenhamos uma grande responsabilidade. Cremos numa fé racional e inteligente, que nos ensina a conviver com os anjos e os demônios. Assumimos o dever de amar o próximo e desprezar o mundo. Somos pecadores vocacionados à santidade. Temos medo do Inferno e sonhamos com o Céu. Carregamos em nossos ombros um grande jugo, que o nosso Pai garante que é suave.

Meus caros, acredito realmente que o nosso tempo sofrido e doente está pronto para receber a Boa Nova. As pessoas estão perdidas, necessitadas de sentido, precisando acordar e perceber toda a beleza escondida debaixo dos entulhos de preconceitos e mentiras que as separam da fé. Temos visto tantos exemplos, tantas histórias, tantos testemunhos. Há muita vida na Igreja, muita força. A nossa Casa se renova, se purifica em meio às suas dificuldades, aos seus erros, aos seus escândalos. A hostilidade está criando união, está despertando a fidelidade e a coragem dos cristãos. Presenciamos um momento muito especial na história do homem e da Igreja e precisamos fazer valer esta presença. Outro dia lia novamente a vida do Beato Pier Giorgio Frassati (http://www.piergiorgio.com.br), que uma vez já apareceu aqui no blog. Ele tinha um grupo de seis amigos que compartilhavam muitas vivências e aprendizados juntos. Há algumas cartas trocadas entre eles, muito ricas e belas. Impossível não lembrar da caminhança, assim os tenho comigo. E para concluir esta minha carta, dedico uma frase que Pier Giorgio dirigiu a seus amigos:

Infelizmente, uma por uma das amizades terrenas produzem dores no nosso coração pelo afastamento. Por isso, queria que fizéssemos um pacto indestrutível que não conhece limites temporais, nem fronteiras físicas: a aliança da oração”.

Amigos queridos, fiquem com Deus! Permaneçamos juntos! Não desistam!

Um forte abraço, saudades,

Miguel.

2 comentários:

  1. Mais um puxão de orelha! Daqui a pouco não tenho mais orelhas...rs

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  2. Miguel cumpre bem com o espírito de Exupéry: "Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas" e "Eu te desejo fiel. Porque a fidelidade consiste em ser fiel, antes de tudo, a si mesmo". Valeu, garoto!

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