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muro que se estende sobre a paisagem que
avisto da janela me interroga. Um muro com curvas familiares. A janela também,
muito familiar. A ardósia escolhida como piso há alguns anos atrás, a vista do
armazém ao fundo, a Igreja em que fui batizado. Brotam destes prédios alicerces
invisíveis que rompem a linha do horizonte e do tempo. As horas continuam
incessantes, porém sigo em meu ritmo e descubro que tenho margem. Não me deixo
inundar pelo embalo indiferente dos segundos. Tenho a minha história, que corre
pelo leito rasgado no chão em que nasci. Longe da aparência agitada e
cosmopolita das grandes cidades, a vida se perfaz cotidiana, nos bairros, nas
ruas, nas casas, tomadas pelos passos dos que ali moram. Em nenhuma outra
estação pode um homem se reconciliar. Ainda que a inquietude o leve à aventura
de correr o mundo, muitas vezes a longa jornada só termina quando, finalmente,
ao encontrar uma terra amável em que decide ficar, surpreende-se ao reconhecer
tão-somente a sua pátria. Diz-me o muro: sulca o teu caminho, crava a tua
herança. Sem margem trasbordas no vazio. Marca, entalha, deixa rastro. Estes
são os vestígios que te reconduzirão, na confusão do espaço e do tempo, até as
raízes que te geraram. Para que sempre possas retornar a elas, como o tropeiro
no entroncamento de estradas. Para ti sempre haverá um porto seguro aonde
chegar e donde partir. Um misterioso lugar, a que os sábios dão o nome de lar.
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