sábado, 17 de outubro de 2009

Prosa à Riobaldo do Sertão: Veredas da Grande Cidade (com a licença... sem pretensão e sem ofensa)

Essa coisa que a gente sempre está buscando... Sempre se esgotando aquela alegriazinha de viver... Dois tapa dá revolta do mundo de novo. Contrariedades tanta. Não adianta. Ora feliz, na hora seguinte tristeza, neste mundão! Não tem jeito... Em tempos assim, de dificuldade. Não tem como o juntado dinheiro dos outros... O caro do trabalho barato. Coisas sem explicação. Sorte de quem conhece o trabalho que tem mais precisão. Ofício bom é ofício necessitado! Quem não precisa por natural, deixa que alguém inventa de necessitar. E logo sai a cabritada atrás do que se inventou. Inventor safado! Engana necessidades, brinca de coisa séria que não se deve, coisa que só Deus é que é feito de fazer. A verdadeira precisão. E penso e digo que nada não adianta ler trecho de livro sem saber o que veio antes... Depois isso é que dá briga de deuses... Querem que leia só parte da bíblia-o-livro-sagrado, e vem querer colocar idéia na minha cabeça. Discordo. Antes veio muito mais nas páginas. Para se obter de idéias é preciso ler tudo, interpretar segundo inteireza de tudo. Senão coloca qualquer coisa no lugar e se acredita. E tem de pôr cada página no chão, assentar firme na face do real. A verdadeira precisão. Fé burra! Fé sangrenta, sem dó, sem razão alguma! Antes a descrendice. Que tudo leva aos certos de Deus, já dizia a senhora lá das bandas de Divinópolis, a mineira Adélia, fazendo pouco do que-não-se-diga. Pior que não-fé é a fé-inabalável. Insuportável. Tem de deixar vir o natural, tudo descobrindo, o misterioso de tudo. Desconfiado. A vida ajuda, não tem jeito. Nem ninguém foge, nem atalho passo curto na mata. É sempre o igual caminho meu, seu, de qualquer cabra, homem ou mulher. Viver é muito perigoso. Causa disso que eu digo e repito: pai pra filho é asa e raiz!

E tem mais essa mania que agora a gente tem de querer arranjar tudo em leis. É qualquer bobagenzinha, qualquer probleminha à toa, do mais trivial, sempre tem alguém querendo levantar solução escrevendo o proibido e o permitido em letras de jurista. Não que seja de todo equivocado, é bom que se diga, no meu curto entendimento, que se ponha claro e em bom português declarado, o regramento básico do conviver de uma gente de uma terra. Isto é o essencial. Já que o velho costume soprado em berço e prosa se alarga demasiado, não dando conta de todo recado. De modo que cabe bem a existência do texto escrito e do martelo oficial, para quando dois não derem liga por vontade, ao menos se dê a gosto do resto do povo. Que ninguém quer briga se prolongando em duelo e rixa de parentes, desgraça boba e profunda, causadora perpétua de mortes e tristezas. Afinal das contas, tudo é que serve a encontrar um bom jeito de conviver melhor, senão em felicidade plena, ao menos em tragédia compartilhada. Porque tem coisas que regramento nenhum humano dá conta de findar. Viver é muito perigoso.

Mas voltando ao colóquio, a prosa de endireitar. Que mania besta é esta, alguém ache explicação, de pensar o bicho homem que tem cabimento querer tudo controlar, assim escrito em papel e ordem de mandar, tudo ao juiz ordeiro, com caneta e toga, capaz de organizar a bagunça mestra. Eta bobagem! Eta ilusão! Mais vale uma ordem bem dada e obedecida, que cem ordens cantadas ao vento, já dizia meu compadre meu. Vento não cria autoridade. Dá no máximo ventania. E se é certo que passou de três homens (e se ainda houver mulher no meio) já se faz necessário um combinar de regras e um que as faça cumprir, não é menos verdade, nem mais mentira, que homem não é burro (ou não costuma ser) e não vai obedecer ordem dada frouxa.

Porque é evidente, todo mundo vê, todo mundo sabe. Dá vergonha de aceitar. Mas é quando mais um homem precisa de lei é quando mais ele quer estar fora dela, doido para ninguém perceber, ligeiro! Na frouxidão é que ele escapa, e de resto escapa todo regrar. Assim desacreditada é que ninguém mais pega de obedecer. Um contando ao outro um jeitinho atalho de esperteza. A regra o homem faz, a regra o próprio homem quebra. Causa disso é que é preciso criar norma forte, razoável, que não apeia, não apeia... Deixa viver à vontade. Mas quando bate na cerca do limite, age! E nisso é infalível! Nisso ninguém escapa! O resto... O resto a gente deixa para o coração partido, para o arrepender, para a expiação da verdadeira culpa. Deixa para mãe debruçar em berço, para chinelada de pai, pra seio de família. Para olho feio de vizinho, pra bengala de vó, pra conselho de amigo. O resto.

Só talvez, pois sabe lá o certo, quem sabe? Possa dá jeito de existir um gostoso viver. Porque com o homem é assim. Tem necessidade acreditar, desconfiando. Mas não basta só o desconfiar. Nem só acreditando. Dá chance pro menino! Mas põe as rédeas no lugar. Pro puxar necessário, o coice leve e bom. A pequenina força bruta. Com jeito. No corriqueiro, no dia-a-dia, no normal-trivial, uma soltura que dá gosto apreciar! A construção! A caminhança! Eta homem bom! Mundo bom! Vida boa!

Um comentário:

  1. Miguel do sertão... Belas reflexões a la João! Como foi dito há um tempo atrás - esse homem não deixa a caminhança morrer!

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