Será a hora?
Encerraram-se definitivamente os trabalhos? Estas palavras, esta escrita
(derradeira?), com que propósito? Sinto doer as vísceras à procura de um tema
ou, mais que isto, de uma forma. Outras vezes já cantamos aqui a ausência Dela.
Mas este novo silêncio é morte ou espera? Quando tudo tende ao óbvio, ao
trivial e pior, ao lugar-comum, apenas entrego alguns minutos defronte o papel,
como se Lhe dedicasse uma oração, implorando Sua visita. Meu pensamento se
decanta no discurso pobre e positivo das letras de lei, literalmente. Toda
metáfora me escapa, pois estou intoxicado do que se apresenta como o único real.
A banalidade da superfície soberba que toma o lugar do todo. Enganadora e
meretriz. Ridícula no sorriso bajulador de homens de terno e gravata, trágica
no desespero de jovens sedentos de estabilidade. O concurso, o discurso, o
recurso. A quem? A quem recorrer da estúpida rima? Quem me salvará desta vez?
Adélia, Suassuna, Tolentino? Chagall, Pirandello, Mozart? Que nova descoberta
me demoverá desta crua certeza de que as ruas me conduzirão apenas ao corredor
abarrotado de homens em busca de sobrevivência? Procuro a pequena fresta, onde
se abrirá? Ela que já me salvou tantas vezes... Sem meu coração livre, sei que
não será possível. É pequenina, mas necessita de grande espaço. Um espaço
infinito de intimidade. Sofro de saudades. Não de nostalgia, que é pura
ausência, mas de saudades, que é mistério de presença... Espera... Esperança.
Fecho os olhos e antevejo surgir dos escombros da cidade de cimento as
montanhas de um belo condado. Em uma das varandas das inúmeras casas ricamente
ornamentadas, vejo um velho sentado e sua longa barba. Seu cajado, a espada.
Este lugar que é uma fortaleza e um verdadeiro castelo murado. O epicentro da
resistência contra as largas avenidas automobiliadas e os edifícios de concreto
e ferro espelhados. Por si mesmos inocentes, não fosse a alma que os planejou,
numa arquitetura de maldição. Sim, é Ela! A imagem do condado, o velho sentado,
a anunciada guerra contra a deformidade... São sinais. Respiro consolado. Sob a
Sua inspiração? Discreta e delicada se apresenta em alguma fresta ainda não
descoberta. Oferece esta pouca alegria, que já me faz seguir em paz. Aceito mais
este convite e espero. Ela saberá a hora.