terça-feira, 15 de outubro de 2013

Residências criativas na Casa do Sol - Vamos, Miguel? - http://www.hildahilst.com.br/site/

Em 2012 o Instituo Hilda Hilst retomou seu projeto de Residências Artísticas. O objetivo é promover o intercâmbio entre artistas e pesquisadores de diversas áreas do conhecimento e o desenvolvimento da criação artística. Não é condição sine qua non que o objeto de estudo/pesquisa seja a obra e/ou a vida de Hilda Hilst, nem que seja a literatura seu eixo central. O IHH abriga não só escritores, poetas, filósofos, dramaturgos e atores, como também artistas visuais, músicos, estilistas, físicos e matemáticos. O que é fundamental é que haja trocas de ideias, compartilhamento de conhecimentos e experiências. O IHH acredita que é justamente na confrontação com outras realidades e na experimentação de novos conceitos que a criatividade é potencializada, e possa agir não só como uma ferramenta de desenvolvimento artístico mas também, e principalmente, pessoal. O IHH abriga por enquanto apenas dois residentes por período. O pré-requisito básico da residência é que o interessado tenha lido ou conheça a obra de Hilda Hilst e que goste de cachorros, também moradores da Casa do Sol. Os períodos de residência podem variar de uma ou duas semanas a até três meses. Estadias mais longas dependem do projeto do residente e tem outras especificidades. A presença do residente no instituto normalmente é ininterrupta. Quando se trata de uma duração mais longa, ele poderá estar autorizado a deixar a residência por um período e depois retornar. Visitas somente quando notificadas com antecedência e com permissão dos administradores da casa. O residente tem um quarto individual, banheiro ao lado, wi-fi, acesso acompanhado para pesquisa e/ou consulta à biblioteca da casa que soma cerca de 5 mil livros; além de conviver com os moradores e administradores da casa, Olga Bilenky, artista plástica e grande amiga de Hilda Hilst; e Jurandy Valença, artista plástico, jornalista e diretor de projetos do IHH. Os projetos enviados devem conter trechos e/ou imagens de trabalhos realizados, currículo atualizado e, sobretudo uma proposta de trabalho, com descrição do que o artista pretende desenvolver durante a residência. Contate-nos para maiores informações e custos.

Sobre meu último contato com o Teatro

Querida professora, Bom, o curso básico de teatro marcou minha vida. Comecei-o em um momento de crise (em que repensava minha profissão de homem das leis, homem da justiça) e ajudou-me a retomar com mais amor tudo o que já fazia antes, auxiliou-me a lembrar que sempre preciso brincar e jogar para que continue fazendo arte em meu trabalho, nunca posso deixar de ser a criança feliz que sempre fui. Sempre classifiquei-me como artista, talvez por pretensão e arrogância, típicos de minha profissão jurídica, talvez por talento e sensibilidade, verdadeiras características do artista, provavelmente pelas duas razões. Mas a verdade é que sempre esforcei-me por ser um artista. Sempre que percebo estar caindo em soluções produzidas em série, lembro que I need to play and I need to play e o milagre sempre se faz, volto a ser aquela criança feliz e arteira! Sempre tive uma queda pelo teatro, provavelmente foi isso que sempre me encantou no Direito, talvez o encantamento que nos maravilha, provavelmente o encantamento que nos enfeitiça, para não perder a ironia... Piadas à parte, também amo muitíssimo o teatro, provavelmente um dia vou encará-lo de forma mais sistemática, sinto tal necessidade em meu interior, mas o Curso Básico ajudou-me a conhecer o teatro real e vivo, o teatro de nossas relações humanas, de todo nosso cotidiano, e recuperou-me para que voltasse a atuar recuperado, renovado da crise que minha vida me propunha. Poderia falar muito mais, tenho a convicção de que nem sei ao certo tudo o que recebi no curso, também sei que dei muito de mim - as semanas eram curtas para dar e receber tudo o que o curso exigia, não conseguia fazer mais nada, tudo girava em torno das aulas. Poderia falar das peças a que me dirigi, dos livros que li, dos amigos que fiz, tudo movido por aquelas semanas mágicas. Por que não continuei com tudo aquilo? Eis uma pergunta que ainda não respondi. Creio que não suportaria tanta Luz. Penso que não parei com tudo aquilo, só não estou preparado para a forma como tudo aquilo se apresentou, se mantivesse naquela esteira não seria algo verdadeiro, não seria de dentro para fora, mas de fora para dentro. A forma que busco hoje é a forma que melhor se adapta àquilo que levo em meu interior, uma enorme sede de Justiça, de lutar por aqueles que são injustiçados. Quer drama maior? A Luz posta em tal forma não ofusca meus olhos, assim sei que sou capaz... Satisfação em poder contribuir! Espero que você sempre continue sendo a professora e artista brilhante e generosa que sempre foi. Também aceito palpites felizes para minha caminhada! João Augusto!!!

Sobre Caminhança

Bom dia, João Augusto, Sou obcecada por terminar tudo o que começo. Por isso, comecei a ler seus textos e terminei, mesmo que isso tenha me custado grande parte da noite de sono. Aliás, não só por isso, mas também porque a leitura estava bastante agradável. Resolvi escrever minhas impressões para que elas não se dispersassem. Essa leitura apenas ratificou todos os meus pensamentos a seu respeito. Você é uma pessoa tão íntegra, humilde, honesta, culta... e principalmente, você é tão honesto consigo mesmo. Você nem imagina o quanto eu o admiro. Aliás, acho que essa é a fonte de tantas crises com o Direito e com o concurso para a magistratura: sua honestidade. Você se recusa a se render às fórmulas prontas... a ser um “concurseiro padrão”. Por outro lado, dessa forma você prolonga os anos de reprovações e, consequentemente, o tempo de estudo e as crises (que você acha que são relacionadas à sua vocação, mas, no meu modo de ver, não são). Para mim, sua vocação é muito nítida. Acho que você seria um ótimo advogado, você é um servidor exemplar, pelo que tenho acompanhado, mas você nasceu para a magistratura. É evidente também que você tem alma de artista e que seria um escritor fabuloso. Porém, você não precisa optar entre ser juiz ou ser artista. Você tem duas vocações conciliáveis. Especificamente, em relação ao concurso, você está em um círculo vicioso, na minha opinião: se recusa a ser um “concurseiro padrão”, ainda que, dessa forma, demore mais para ser aprovado, o que, de fato, vem ocorrendo; em razão dessa demora e das sucessivas reprovações, você questiona sua vocação e entra em crise, o que faz com que, momentaneamente, você se distancie de seu objetivo (o concurso, que, por algum tempo, deixa até de ser o objetivo); durante a crise, sua veia artística se aflora e você se aproxima da literatura ou do teatro; mas, por fim, sua outra vocação (a magistratura) te chama à razão e você retoma os estudos com afinco, mas, ainda assim, sem se render às formulas prontas...e assim sucessivamente. Apesar de concordar com você, apesar de achar medíocre esse estudo “decoreba” que os examinadores normalmente esperam dos candidatos, do jeito que as coisas caminham você só faz com que suas angústias se prolonguem. Acredite: você tem vocação para ser juiz. Você é uma grande fonte de inspiração para mim. É uma pessoa coerente e com um imenso senso de justiça. Não duvide disso em nenhum momento. As reprovações não devem gerar tal questionamento, até mesmo porque foi você quem escolheu o caminho mais longo conscientemente. E se não o fez conscientemente, tome agora consciência disso. Você é uma pessoa tão inteligente e erudita. Merece muito ser aprovado. Mas, se você quiser passar logo, vai ter de sacrificar-se por um estudo medíocre. É triste, mas é a realidade...são essas as regras do jogo. Para minimizar essas crises e as dúvidas quanto à sua própria vocação, recomendo que você seja menos honesto consigo mesmo, apenas por algum tempo. Assim, você será provavelmente aprovado mais rapidamente, e essa angústia terminará. Duvido que você concorde comigo, pois você é uma pessoa fiel aos seus ideais. Nada mudará. Você se recusará a ser uma pessoa medíocre, que faz leituras medíocres...então, só me resta pedir a você que não duvide mais da sua vocação, encare com naturalidade as batalhas perdidas, e espere pacientemente o seu momento. Vou continuar refletindo sobre o que li. A propósito, suas poesias são lindas e eu adorei os textos sobre os planos para a aposentadoria. Você é genial. Enfim... quero te ver feliz. Magistrada amiga, recém-empossada.

Fatos e mais fatos

Finalmente, consegui ficar menos de dez horas no trabalho, e recebi um presente, como aquela aspiração após mais de minuto debaixo d’água. Não posso negar que andei de soslaio com a Adélia hoje cedo. Eta mulherzinha atrevida! Andava distraído, cá com as caraminholas de sempre. De repente, uma placa me intriga, “Mina do Machado”, nossa, que isso aqui no meio da cidade? Um pouco à frente uma senhora distinta volta com dois galões. Fico curioso: - Moça, essa água é boa? Pode beber? Ela, solene e espantada com minha ignorância: - Claro. Vem gente até de outras cidades pegar água aí! – Ah, brigado. Adiante está um bosque, no meio dele a festejada mina d’água. Um filme antigo passa em minha cabeça, rodado na minha infância, quando ainda buscávamos água em bicas lá no interior de São Paulo. Há muitos anos isso acabou, a última vez que tinha visto isso, os ladrões ainda tinham cara de pau – como dizia o Poeta. Minas Gerais ainda é assim, o fato poético está em toda esquina, basta estar disposto a ele. E eis que acordo à poesia, a antiga Musa retorna, e uma sucessão de fatos mostram que todos os fatos poéticos sempre estiveram ali, rindo de minha vida patética. Noto um homem sentado no chão defronte à sua casa: - Ôpa! - Ôpa! Um outro está observando o chuvisqueiro: - Mudou o tempo, hein! - É, vem mais lá do leste. Outros dois senhores conversam despreocupados bem no meio da rua. As plantas desajeitadas de meus tênis ferem o trabalho de toda a tarde de um pobre pedreiro, ainda estava fresco o cimento: - Vixe! Notando minha compenetração de quem tem licença poética: - Não tem problema! Vejo um pé de romãs no jardim de uma casinha (essa poetisa...). Poderia continuar a descrever todas as imaginações e desvarios que se seguiram, mas basta, a vida é assim mesmo, só é preciso estar aberto para que a Luz volte e ilumine-nos com clareza solar, ainda que debaixo de chuva. O bom senso-loucura das letras jurídicas me chama de novo, enfim, nem só de rosas (e romãs) é feita a vida... Esses os fatos de hoje...

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Esse homem é livre?

"[...] O mundo proclamou a liberdade, sobretudo ultimamente., e eis o que vemos dessa liberdade deles: só escravidão e suicídio! Porque o mundo diz: "Tens necessidades e por isso satisfaze-as, porque tens os mesmos direitos que os homens mais ilustres e ricos. Não temas satisfazê-las e até procuras multiplicá-las" - eis a atual doutrina do mundo. É nisso que veem a liberdade. E o que resulta desse direito à multiplicação das necessidades? Para os ricos o isolamento e o suicídio espiritual, para os pobres, a inveja e o assassinato, porquanto esses foram concedidos mas ainda não se indicaram os meios de satisfazer as necessidades. Asseguram que, quanto mais o tempo passar, mais o mundo irá unir-se, irá constituir-se num convício fraterno porque isso reduz as distâncias, transmite as idéias pelo ar. Ai, não credes nessa união dos homens. Compreendendo a liberdade como a multiplicação e o rápido saciamento das necessidades, deformam sua natureza porque geram dentro de si muitos desejos absurdos e tolos, os hábitos e as invenções mais disparatadas. Vivem apenas para invejar uns aos outros, para a luxúria, a soberba. Dar jantares, viajar, possuir carruagens, posição social e criados escravos eles já consideram uma necessidade, e para saciá-la sacrificam até a vida, a honra, o amor ao homem, e até se matam se não conseguem saciá-la. Vemos a mesma coisa naqueles que não são ricos, e entre os pobre o não saciamento das necessidades e a inveja ainda são abafados pela bebedeira. Em breve, em vez do vinho haverão de embebedar-se com sangue, para isto estão sendo conduzidos. Eu vos pergunto: esse homem é livre? [...] É por isso que no mundo vem-se extinguindo cada vez mais a ideia de servir à humanidade, a ideia da fraternidade e da integridade dos homens, pois, em verdade, essa ideia já está sendo recebida até com zombaria; porque, como esse escravos se afastaria de seus hábitos, para onde iria se está tão acostumado a saciar as infinitas necessidades que ele mesmo inventou? Ele está isolado e pouco se importa com o todo. Eles chegaram a um ponto em que acumularam objetos demais, porém ficaram com alegria de menos." (Fiódor Dostoiévski em "Os irmãos Karamásov")

quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Pru quê (Pompílio Diniz)




Pru quê tu chora, pru quê?
Pru quê teu peito saluça

e o coração se adebruça
nos abismo do sofrê?
Tu pode me arrespondê?
Pru quê tua arma suzinha
pelas estrada caminha
sem aligria mais tê?

Pru quê teus óio num vê
e o coração não escuita
no sacrificio da luita
este cunvite a vivê?
Eu te prugunto, pru quê?
pru quê teus pé já sangrando
cuntinua caminhando
pela estrada do sofrê?

Pru quê tua boca só fala
das coisa triste da vida
que muita veiz esquecida
dentro do peito se cala?
quando o amô prefume exala
pru quê tu mata a simente
dessa aligria inucente
que no seu sonho se embala?

Pru quê que teu coração
é cumo um baú trancado
e dento dele guardado
só desespero e afrição
Pru quê num faiz meu irmão
uma limpeza la dentro
varrendo cô pensamento
os ispim da mardição?

Pru quê tu véve agarrado
nas asa desse caixão
que carrega a assumbração
desse difunto, o passado?
Se tu já véve cansado,
interra todo o trumento
na cova do isquicimento
pra nunca mais sê lembrado

Despois disso, vem mais eu...
vem ouví pelas estrada
o canto da passarada
que em seu peito imudeceu.
escuita a vóz das cascata,
chêra o prefume das mata,
óia os campo, tudo é teu...

Aprende côs passarim
que só tem vóz pra canta
com o sor que nasce cedim
e vem teu frio esquentá
Óia as estrela, o luar
mas antes de tu querê
isso tudo arrecebê
aprende primeiro...
a dá.

terça-feira, 1 de outubro de 2013